Nas organizações atuais muito se falam das doutrinas de Maquiavel como técnica competitiva no ambiente de trabalho. Veja:
http://www.catho.com.br/carreira-sucesso/dicas-emprego/como-liderar-com-as-ideias-de-Maquiavel
e também o livro “Maquiavel e a Liderança Moderna” de Michael A. Ledden

Não farei comentários sobre o livro de Michel A. Ladden, e sim uma análise central das idéias de Maquiavel e o sua utilização nas organizações. Maquiavel assim se expressa em relação a sua doutrina: “o bem pode sair do mal” ou ainda pior “Os fins justificam os meios”. Máximas de lobos, disfarçadas em pele de cordeiros. Isto me faz lembrar tantas atrocidades cometidas em nomes dessas máximas, e quantas mais serão cometidas enquanto se acreditar nelas.

Extrair instrumentos de competitividade no ambiente organizacional a partir da obra “O Príncipe”, ou “O Tratado do Príncipe”? Existem alguns motivos para o meu desacordo para esta ideia: O Príncipe é um livro, na realidade, sobre o que há de mais sórdido na natureza humana ao mostrar para os governantes o que eles devem fazer para manter o total controle sobre seus reinos, a qualquer preço, seja pela força da “lei” criada pelo absolutismo e totalitarismo, ou pela espada e nunca pelos direitos individuais, pela liberdade, justiça e igualdade.

O que o Maquiavel descreve em sua obra e que vem ganhando adeptos no ambiente organizacional como lição de competitividade e foco, é a pura aplicação de que “Os fins justificam os meios”: não funciona.

Uma empresa em que os valores têm como premissas a concorrência honesta, o respeito pelos seus clientes, colaboradores e parceiros de negócios, baseado em ações éticas e morais, não aceitaria os ensinamentos de Maquiavel, nem mesmo para extrair destas orientações isoladas com o intuito de motivar seus colaboradores a produzirem mais.

Embora muitos possam afirmar que a ideia é retirar dos ensinamentos de Maquiavel as diretrizes que impulsionarão os executivos se tornarem mais agressivos no ambiente de trabalho, não podemos esquecer que pela própria natureza humana o mal é mais sedutor. A cada resultado alcançado a partir destes princípios, novos avanços seriam feitos em direção ao abismo maquiavélico e as pessoas se afundariam mais e mais até que não pudessem mais sair dele, pois afinal, não podemos ser fiscais de nós mesmos e o entusiasmo pelos resultados pode levar a criação de um ambiente organizacional altamente nefasto para o futuro da empresa, ainda que alguns resultados iniciais se mostrem favoráveis.

As únicas lições que creio poderem ser retiradas dos ensinamentos de Maquiavel que priorizam a lei dos mais fortes e mais espertos, e que rebaixam a dignidade humana em detrimento a interesses pessoais; é que este é um manual de como nós não devemos agir no ambiente de trabalho.

Entretanto, como uma análise de que os governos despóticos não se sustentam, e como uma validação da convicção de que governo baseado na liberdade e direitos individuais é o que precisamos, creio que a leitura e a compreensão de O Príncipe se faz necessário tanto para o estudante do ensino médio, como para o político, como para os empresários. Enfim para todas as pessoas conscientes que uma nação se faz com justiça, com igualdade, com liberdade e respeito aos direitos individuais.

O capítulo XVIII é o que mais expressa a essência dos ensinamentos de Maquiavel.

“Assim, devemos saber que existem dois modos de combater; um, com as leis; o outro, com a força. O Primeiro modo é o próprio do homem; o segundo, dos animais. Porém, como o primeiro muitas vezes mostra-se insuficiente, impõe-se um recurso ao segundo. Por conseguinte, a um príncipe é necessário saber valer-se dos seus atributos de animal e de homem.”

“Portanto, não pode nem deve um soberano prudente cumprir as suas promessas quando um tal cumprimento ameaça voltar-se contra ele e quando se diluem as próprias razões que o levaram a prometer.”

“Aliás, razões jamais faltam a um príncipe para fundamentar o descumprimento das suas promessas.”

“Todavia, terás de saber como colorir essa face da tua natureza, fazendo-te um grande simulador e um dissimulador… que aquele que sabe enganar encontra sempre um outro que, justamente, se deixar enganar… havendo a possibilidade, ele não se aparte do bem, mas que, havendo a necessidade, saiba valer-se do mal.”

“Cada qual vê o que pareces ser; poucos têm o sentimento daquilo que de fato és; e estes poucos não ousam contrapor-se à opinião dos muitos, que contam, em sua defesa, com a majestade.”