Não é segredo para ninguém minimamente informado e que tenha algum grau mínimo de inteligência, de que há uma massiva ideologizacão esquerdista nas faculdades brasileiras, principalmente nos cursos de humanas ministrados nas universidades estaduais e federais. Alguns alunos dessas instituições têm demonstrado o seu repúdio e protesto através das redes sociais. Consequentemente, os alunos que não concordam com o conteúdo das aulas são perseguidos pelos colegas de sala de aula e não é incomum, pelos professores e corpo administrativo.

Com efeito, o conteúdo das aulas de humanas é o que mais impressiona. Os assuntos são escolhidos para mostrar unilateralmente apenas um lado da realidade política, social e econômica, tanto do ponto de vista histórico e filosófico quanto político, ao passo que a outra vertente é esquartejada e incinerada visando a eliminação total de qualquer pensamento opositor.  Além dos professores terem sido massivamente influenciados pelo marxismo, o próprio conteúdo das disciplinas é preparado de maneira a mostrar apenas um lado da moeda. Feito tábula rasa, as cabeças dos alunos vão sendo preenchidas paulatinamente com ideias que futuramente exercerão o papel de propagadores delas com elevada incapacidade de aceitar argumentos em contrário. Isso não só acontece nas universidades particulares e públicas, como em todo o sistema de ensino desde o infantil. Assim, o aluno é preparado para se posicionar apenas de duas maneiras: ou contra os opositores da sua ideologia ou a favor daqueles que pensam como ele, sendo que como opositor é incapaz de aceitar que o outro lado pode estar com a razão.

A preparação ideológica de mentes jovens como forma de dominação não é um fenômeno novo. Desde que os Militares assumiram o comando do país, em 1964, que esse processo vem evoluindo sistematicamente ao longo do caminho  gerando situações de conflitos que algumas vezes se localizam além da dicotomia esquerda e direita. É exatamente isso que veremos num dos maiores debates acadêmicos que aconteceu aqui no Brasil, posto a público através do livro Liberdade Acadêmica e Opção Totalitária, do consagrado professor e filósofo Antônio Paim.

Em 1979, segundo relata o consagrado professor, a então professora Anna Maria Moog Rodrigues pediu demissão do Departamento de Filosofia da PUC-RJ por não aceitar a censura ao texto extraído do livro Pluralismo e Liberdade do professor Miguel Reale pelo chefe do Departamento de Filosofia da PUC-RJ. Ao pedido de demissão da professora Maria Moog, seguiu-se o do seu marido e do próprio autor da supracitada obra, Antônio Paim. O que se viu, muito diferente dos debates de hoje, foi um debate que na expressão do próprio Antônio Paim foi  “um debate memorável”. De um lado, os que saíram em defesa da professora Ana Moog, de outro, os que defenderam a instituição.

Antes de mais nada, uma nota de suma importância e de alta pertinência: vale ressaltar que o grande debate em Liberdade Acadêmica e Opção Totalitária deveria servir de exemplo de como realizar um debate de alto nível. Vergonhosamente, os debates da atualidade são permeados de desrespeito ao oponente em que, aos gritos furiosos de ambos os lados, o que importa é a “verdade” de cada um debatedor. Mas, retomamos a linha dorsal do texto para expor como a ideologia vem ao longo do tempo ocupando espaços nas academias. Neste sentido, o livro Liberdade Acadêmica e Opção Totalitária retrata bem este fenômeno.

Tudo começou quando o Jornal do Brasil público a carta da professora Anna Maria Moog Rodrigues endereçada ao chefe do Departamento de Filosofia da PUC-RJ, na qual protestava contra a censura de um texto do professor Miguel Reale que seria incluído como material didático no curso da disciplina História do Pensamento, conforme narra o professor Antônio Paim na página 12, capítulo 1 (O evento). Sustenta o professor Antônio Paim, que o texto foi discriminado pelo chefe do Departamento sob a alegação de divergências políticas com a história de vida do professor Miguel Reale. A professora Anna Maria Moog Rodrigues, por sua vez, “por considerar este ato arbitrário e cerceador da liberdade acadêmica”, descreve Paim, “apresentou o seu pedido de exoneração ao Corpo Docente da PUC“: Estava armado o palco para o grande debate que agitou intelectuais, acadêmicos e pessoas comuns, num Brasil que ainda respirava os últimos ares do período da ditadura militar no Brasil.

Antônio Paim aponta que “explicando as razões da censura, o chefe do Departamento de Filosofia da PUC indicou que não havia conveniência de realçar uma figura controvertida nos meios universitários, especialmente entre alunos. E como se incumbiu de explicitar um dos defensores da censura, o caráter controvertido do autor censurado prender-se-ia à sua condição de ex-integralista”. O grande problema aqui não é a obra do autor censurado, mas a sua condição de ex-integralista (Ação Integralista Brasileira). A AIB foi um movimento político brasileiro ultranacionalista, corporativista, conservador e tradicionalista católico de extrema-direita fundado por Plínio Salgado (1895―1975) ao qual o professor Miguel Reale se filiara. Vê-se então que a censura recai tão-somente em função ideológica. Isto porque já na época do episódio as universidades  brasileiras estavam impregnadas pelas ideias marxistas. 

O pensamento de Karl Marx estava (e ainda está) presente em todos os momentos da vida acadêmica nos cursos de humanas. Sendo um ex-integralista o texto do professor Miguel Reale não  era bem visto e daí a censura do departamento de filosofia. Destaca o professor Antônio Paim que  “emergiu, de modo destacado, a preocupação com a influência marxista em muitas Universidades e na Igreja católica. Essa preocupação é compreensível, porquanto, sabidamente minoritários, os grupos marxistas ganham uma caixa de ressonância muito grande com a circunstância indicada.” O professor Antônio Paim esclarece ainda que “o cerne da liberdade acadêmica é a liberdade de cátedra, assegurada pela Constituição e pela tradição brasileira. Isto significa que nenhum Departamento tem o direito de imiscuir-se na matéria, que é da responsabilidade individual do professor. A Universidade pode, certamente, divergir da orientação que determinado professor tenha decidido imprimir à disciplina de sua responsabilidade e, neste caso, dispensar os seus serviços. Mas há de fazê-lo às claras”

O professor Antônio Paim argumenta que “a crise da PUC serviu para evidenciar que, mais uma vez, em nossa contemporânea história, os intelectuais brasileiros facilmente se deixam empolgar pela opção totalitária“. O que se viu à época, é o que se vê na atualidade brasileira. Para a esquerda militante, aqueles que gritam por liberdade são os primeiros cerceia-la nos outros quando as ideias divergem das suas. Na sua pesagem vale a regra dois pesos e duas medidas, acrescida de que os fins sempre justificam os meios. O totalitarismo está de tal maneira instituído, sorrateiramente, que muitas vezes não se percebe que estamos sempre concordando e defendendo ideias e fazendo exatamente o que os radicais (na linguagem de Russell Kirk) querem, sem nos apercebermos que estas ideias não são nossas e que não nos foi permitido contradizê-las pelo simples fatos de não termos aprendidos a pensar de outro modo.

Não vamos nos aprofundar nas discussões e posições antagônicas dos debatedores. Por ora, a exposição feita sobre a obra, denuncia de imenso valor histórico do professor Antônio Paim,  é o suficiente e a revelação de que a censura a liberdade de pensamento, principalmente no ambiente acadêmico, redundando em perseguições e retaliações a quem ousasse ter uma visão que não correspondesse ao pensamento dominante, lança luz ao estado em que se encontra o Brasil atualmente.  

Nos últimos 50 anos a esquerda fincou suas raízes no solo acadêmico e paulatinamente foi tornando dominante a sua visão de mundo. Ela aplicou e implantou a estratégia gramsciana de ocupação das instituições acadêmicas e desta, após formado hegemonicamente os intelectuais orgânicos que deu voz ao clamor da nova esquerda, que mais tarde estariam controlando os meios de comunicação, administrando instituições governamentais, atuando na política, tornando dominante o pensamento marxista e desconstruindo toda a forma de pensamento de direita como bem expôs o saudoso Sérgio Coutinho em seu livro A Revolução Gramscista no Ocidente. Segundo esclarece Sérgio Coutinho, a concepção revolucionária  de Antônio Gramsci para a tomada do poder não poderia, em países em que o imperativo da liberdade é nota dominante, ter sucesso conforme fora em países socialistas. Portanto, era necessário mudar o curso da revolução armada para a ocupação da coisa pública através de três frentes: a cultura, a educação e as instituições. Assim, era necessário plantar as sementes que ao germinarem dariam origem às novas sementes cada vez mais encorpadas com os princípios em questão. E assim foi feito, com assombroso sucesso no Brasil.

Segundo Sérgio Coutinho, “administrativamente, o arcabouço institucional do Estado deve ser preservado, entorpecer consciências e aliciar defensores inocentes de uma ação insuspeitada. As modificações visando à revolução marxista devem ser sutis e adotadas pacientemente, utilizando instrumentos legais e constitucionais, tais como consultas à sociedade civil organizada (sindicatos, ONGs etc.], referendos, plebiscitos e outras formas da chamada “democracia direta”, bem como programas de caráter político, mas apresentados como de índole social, popular e de defesa dos direitos humanos.” Desta maneira, ao longo do tempo nasceu silenciosamente, segundo a estratégia gramsciana de tomada do poder, a hegemonia do pensamento de esquerda de princípios marxista com o claro objetivo de implantar o comunismo, especificamente no Brasil, cuja índole do seu povo facilitava a empreitada, uma vez que facilmente deixa-se seduzir pelos discursos comunistas.

O resultado final é que os revolucionários dos turbulentos anos 60 se tornaram políticos, intelectuais, empresários, pessoas que uma vez conquistadas posições estratégicas na sociedade cuidaram de manter o primado do pensamento socialista comunista e seus privilégios. O resultado direto das estratégias de tomada do poder pela esquerda reflete diretamente o que vivenciamos em sala de aula nas academias. O mais assustador é que uma vez que a educação superior já se encontrava sob o domínio preponderante da esquerda, tratou-se com a maior brevidade possível de aplicar a estratégia nas bases educacionais, modificando e adequando todo o sistema básico de ensino às agendas comunista. Isto foi feito de tal maneira que décadas depois uma pessoa declarar publicamente que era de direita era como se tivesse assinado a própria sentença de morte social.

De fato, numa nação em que tudo se move no sentido da supremacia das ideias da esquerda a outra vertente tende a desaparecer, fato que no Brasil vem se modificando com o levante direitista sob a égide do bolsonarismo. Porém, as raízes plantadas nos áureos  tempos revolucionários são profundas e como a revolução cultural se inicia sempre pela educação, é através dela que a hegemonia do pensamento de esquerda deve ser desconstruída.