No livro “A Mentalidade Capitalista” escrito em 1956 por Ludwig Von Mises (1881-1973), são analisados os porquês do desprezo que os socialistas nutrem pelo capitalismo. O livro é uma desconstrução da mentalidade esquerdistas que costuma apresentar o capitalismo como um sistema desumano e individualista de enriquecimento material, além de criticar a hipocrisia existente entre os seus ferozes críticos por serem ideologicamente socialistas e na prática se beneficiarem do capitalismo. Destaca-se nesta obra a noção de que cada indivíduo é livre para modelar sua vida de acordo a sua vontade, pois segundo Mises, na economia moderna quem cria a riqueza da nação é o indivíduo que como consumidor ou produtor poderá surgir de qualquer estrato social. Ele argumenta que o poder de determinar quais produtos devem ou não ficar no mercado, qual fornecedor deve ou não produzir tal produto, está também ao alcance das classes sociais mais baixas, graças aos mecanismos naturais pautados nos princípios do livre mercado que cria oportunidades para todos. Estes são conceitos que derrubam as retóricas socialistas que defendem que os ricos são ricos porque tornam os pobres mais pobres.
Hoje mais que naquela época, as condições de vida e as oportunidades de ascensão social são bem maiores. Por isso encontramos facilmente pessoas que se encontram no estrato mais inferior da sociedade usufruindo de bens como smartphone, TV 4k, micro-ondas, automóvel etc. Esta situação é impensável no sistema socialista, sobretudo na época em que Mises escreveu o livro. Mesmo hoje, com todas as condições favoráveis pelas relações econômicas entre as nações, potencializadas pela globalização, em que a social-democracia tenta construir um sistema híbrido entre o socialismo e o capitalismo (se é que de fato isto é possível – Mises diria que não), o que percebemos é que as pessoas prosperam pelas condições colocadas pelo capitalismo e não por uma consciência coletivista de cooperação. Mises acredita que todos nós somos movidos por impulsos que nos levam à melhoria econômica e que seria inútil tentar frear os nossos desejos por mais e mais bem.
Por isso ele afirma que diante dessa vontade de consumir só há uma forma de melhorar as condições materiais das pessoas: “acelerar o crescimento do capital acumulado em relação ao crescimento da população”. Mises, então se questiona porque os anticapitalistas nutrem tanto ódio e desprezo pelo capitalismo e ao mesmo tempo desfrutam do bem-estar que o capitalismo lhe proporciona? Para Mises o que causa este comportamento é o que ele chama de “Ressentimento da ambição frustrada” encontrado em pessoas que não se conformam que o dinheiro que deveria ser delas está nas mãos dos capitalistas. Segundo Mises, este ressentimento é causado pela incapacidade destas pessoas de produzir riqueza e por isto, tudo fazem para distribuir o dinheiro de quem realmente produzem estas riquezas. Em outras palavras, os socialistas costumam fazer cortesia com o chapéu do outro.
O ódio que os progressistas têm pelo capitalismo beira a uma patologia cancerígena. É incrível e notório a sua dificuldade em entender o sistema capitalista de cooperação social, que Mises sustenta como o real meio de realização da liberdade. Ele argumenta que “a liberdade sob o capitalismo significa: não depender mais do arbítrio das outras pessoas mais do que elas dependem do meu próprio arbítrio”.
“A autoconfiança e o equilíbrio moral de todo mundo são questionados pelo espetáculo daqueles que deram provas de possuir maiores habilidades e capacidades. Todo mundo está ciente de sua própria derrota e insuficiência”
Para Mises dois grupos se destacam dentro deste cenário: os intelectuais e os colarinhos brancos. No primeiro grupo encontraremos muitos artistas, professores, cientistas e políticos. Estes mantêm pelos capitalistas uma profunda inveja, que muitas vezes não vem do volume da riqueza que os capitalistas possuem, vez que que muitos deste grupo têm tanto dinheiro quanto os ricos dono do capital, mas da forma única que construiu a riqueza: com trabalho, inteligência e com uma profunda determinação para enriquecer. Já o segundo grupo, mas comum, é aquele que contém anticapitalistas que trabalham em escritórios (Mises aqui usa o escritório como exemplo, mas se estende à muitas outras áreas de trabalho longe do “chão de fábrica”) e que inveja o patrão e o colega que trabalha ao lado. Pessoas assim, acreditam que o problema está no sistema desumano do capitalismo que não reconhece o seu talento e a dedicação (quando tem) é que são a chave para o seu sucesso na vida. Esses indivíduos, assegura Mises, sempre culpam o capitalismo pelos seus fracassos.
Este fato me lembra o romance “A Revolta de Atlas”, obra de Ayn Rand, que é uma espécie de protesto a favor daqueles que produzem riquezas e carregam o mundo nas costas feito o Atlas, gigante mitológico. Nesta obra há uma memorável cena protagonizada por Francisco D’Anconia, dono de um império industrial, que representa, com perfeição, “o espetáculo daqueles que deram provas de possuir maiores habilidades e capacidades”. Vale a pena reproduzi-la aqui:
“Então o senhor acha que o dinheiro é a origem de todo o mal? O senhor já se perguntou qual é a origem do dinheiro? Ele é um instrumento de troca, que só pode existir quando há bens produzidos e homens capazes de produzi-los. O dinheiro é a forma material do princípio de que os homens que querem negociar uns com os outros precisam trocar um valor por outro. O dinheiro não é o instrumento dos pidões, que recorrem às lágrimas para pedir produtos, nem dos saqueadores [governo], que os levam à força. O dinheiro só se torna possível por intermédio dos homens que produzem. É isso que o senhor considera mau?
Quem aceita dinheiro como pagamento por seu esforço só o faz por saber que será trocado pelo produto do esforço de outrem. Não são os pidões nem os saqueadores que dão ao dinheiro o seu valor. Nem um oceano de lágrimas nem todas as armas do mundo podem transformar aqueles pedaços de papel no seu bolso no pão de que você precisa para sobreviver. Aqueles pedaços de papel, que deveriam ser ouro, ”são penhores de honra, e é por meio deles que você se apropria da energia dos homens que produzem. A sua carteira afirma a esperança de que em algum lugar no mundo ao seu redor existam homens que não traem aquele princípio moral que é a origem do dinheiro. É isso que o senhor considera mau?“
Quem são os saqueadores e pidões na obra de Ayn Rand? São os anticapitalistas? D`Anconia é o capitalista que representa homens e mulheres que sozinhos produzem, verdadeiramente, a riqueza material do mundo. Para transformar matéria em dinheiro é necessária muita inteligência, suor, dedicação e muito, muito trabalho duro. Esses são os Atlas que carregam o mundo nas costas. Eles não vivem de holofotes. São pessoas fortes, práticas e determinadas. Solitárias, pois são raros e raramente compreendidos.
No capítulo III, “A literatura sob o capitalismo”, Mises faz diversas explanações para mostrar como são criadas as falácias contra o capitalismo com o intuito de difamá-lo, ao mesmo tempo que tentam tornar o socialismo como a única verdade evidente para a salvação do povo. Neste capítulo, ao descrever “o fanatismo dos literatos”, Mises observa que um olhar superficial para as ideologias atuais não revelaria o fanatismo que predomina o discurso dos formadores de opinião pública, cuja maquinações torna inaudíveis quaisquer vozes dissidentes, bem como adverte aos desatentos, para não deixar se iludir pelos constantes atritos entre os comunistas, socialistas e intervencionistas, pois, adverte Mises, “porém, entre eles existe uma total concordância” e completa “a tremenda máquina de propaganda e doutrinação progressista tem sido vitoriosa em impor os seus tabus.” A doutrina progressista criticada por Mises é formada nas concepções marxianas a qual Mises denomina de “dogmatismo inotordoxo” que ele define como uma contradição, uma coleção deturpada de suposições e concepções erradas há muito tempo refutadas. Entretanto, qualquer um que se oponha a esta forma de pensamento será visto como inimigo das causas do povo, hoje, fascistas.
Por outro lado, Mises explica que ao contrário do que pensam os progressistas, o capitalismo não é o responsável pelo desemprego das massas, e sim que o desemprego é o resultado do intervencionismo ao agir para “regular o capitalismo e para melhorar as condições dos homens comuns”, ou seja o remédio criado pela ideologia progressista é a causa da doença, mas a culpa é do médico que diagnostica a doença e se ver impedido de prescrever o remédio. Ocorre que os progressistas não se rendem às evidências e, articulados, buscam novas estratégias para sua sobrevivência. É o que nos diz Mises quando o comunismo e o socialismo, vivendo sob a mesma bandeira ideológica e visto pela sociedade como defensores de ideias extremistas, buscaram com apoio de uma parte dos intelectuais, uma alternativa que, se mantendo fiéis aos princípios marxistas, utilizou-se de novos mecanismos, mas que na realidade, continuou com os mesmos princípios que dão ao Estado todo o controle sobre a propriedade privada e sobre o indivíduo.
“o grande conflito ideológico da nossa época não é a batalha para a distribuição de renda nacional e sim a divergência em relação a escolha da forma mais adequada de organização econômica”
Mises pensava num sistema de produção que de fato pudesse melhorar o padrão de vida das pessoas. Assim, ele se questionava se o socialismo era um substituto à altura do capitalismo e se as condições socialistas se adequam a aquele que ele chamava de “conduta racional das atividades produtivas”. Ele acreditava que o fanatismo e o dogmatismo dos progressistas se manifestavam na recusa em examinar esses problemas. Segundo Mises, para os progressistas o capitalismo é o pior dos males e que qualquer tentativa de resolver os problemas econômico sob a ótica capitalista é um “crime capital”.
Mises encerra o livro analisando “As objeções não econômicas ao capitalismo”. Contra aqueles que dizem que dinheiro não traz felicidade, Mises responde no argumento da felicidade porque o dinheiro pode criar as condições e que este não é a causa, mas o meio. Mises mostra que o argumento de que o capitalismo é endurecedor dos corações tornando – os materialistas, não se sustenta porque qualquer que seja o altruísmo aplicado perpassa pelo bem material como meio de satisfazer as necessidades, até mesmo a da alma, dado que o corpo e eu mente desnutrida salvo os indianos, não encontram força para nenhuma ação da alma lá.
Assim, o capitalismo laissez-faire é o único capaz de unir o materialismo e o altruísmo pelo fato de que um fornece os bem materiais para a satisfação da carne, ao passo que o outro alimenta a alma, senão os mais pobres seriam então os mais felizes. Isto os anticapitalistas não conseguem compreender.